É um poeta verde esse Manoel de Barros. Vez ou outra pego-me cavacando seus versos como quem cavaca terra para caçar minhoca e depois peixe.
Manoel de Barros em Poemas rupestres
Se a gente jogar uma pedra no vento
Ele nem olha para trás.
Se a gente atacar o vento com enxada
Ele nem sai sangue da bunda.
Ele não dói nada.
Vento não tem tripa.
Se a gente enfiar uma faca no vento
Ele nem faz ui.
A gente estudou no Colégio que vento
é o ar em movimento.
E que o ar em movimento é vento.
Eu quis uma vez implantar uma costela
no vento.
A costela não parava nem.
Hoje eu tasquei uma pedra no organismo
do vento.
Depois me ensinaram que vento não tem
organismo.
Fiquei estudado.
* * * *
5 comentários:
Permita-me falar idiossincraticamente!
Passei a tarde ouvindo Beto Guedes, Milton, Oasis, Paganini, Canto Gregoriano, Bon Jovi e vou voltar para casa agora ouvindo Tom Jobim no metrô durante uma hora. Lembrei. Meu fone tá quebrado. Que saco! Só um ouvido ouvirá a melodia que faz mais sentido para mim do que tanta religiosidade moralista, que meus tímpanos já não suportam mais ouvir.
Perdoe-me por fazer do teu blog um espaço para comentários fúteis, como esse, mas esses versos — que, diga-se, não canso de lê-los agora nessa tela — com o som da Calcanhoto não poderiam produzir outra coisa em plena véspera de feriado além de um sentimento romântico pela vida. Aquela estúpidez mineira de ter tanta vontade de viver que dá vontade de nunca ter vivido. Não sei se você entende, mas êta coisa difícil é carregar este fardo chamado mineirice!
Bobagem. O vento é o amigo mais íntimo de quem não tem mar naquelas gigantes terras gerais, onde a gente perde a noção de mundo ao não ver o tal do oceano. Eu, bicho do mato, só fui conhecer a bendita água salgada aos 18 anos, tempo suficiente para ter raízes assaz arraigadas em um mundo aprisionado. O vento, porém, soprou, ainda sopra, e soprará durante muito tempo, um veneno chamado minério de ferro, para cujos pulmões estarão sendo enviadas as piores chagas conseqüentes dos mais altos lucros econômicos da ganância exploratória.
Não tem jeito. A cidade é só um retrato na parede, como dizia seu mais ilustre filho. De lá só trazemos os piores males de nossas vidas contra os quais lutaremos até encontrar o alívio da morte.
Enquanto isso não acontecer, digo: enquanto não vier o ponto final do romance, o jeito é ficar na nostalgia do combate contra o vento. Afinal, seu mistério só será descoberto quando a gente virar pó, podendo, enfim, ser levada pelo tão sagrado ar atmosférico até a morada dos deuses chamada Nada (ou Nonada, para lembrar um bom amigo que lá está há muito tempo).
Um abraço amigo.
Meu caro amigo,
Suas palavras idiossincraticamente mineiras fizeram mal as minhas tripas. Há coisas que você disse e que não deveriam ser ditas assim, em público, ao alcance dos olhos de paulistas, pernambucanos e jamaicanos. Suspeito que há coisas ali que só um mineiro seja capaz de compreender. A amizade íntima com o vento, por exemplo. Lembre-se que o Rosa, aquele ser do nosso solo que se apressou na travessia para descerrar logo os mistérios do No-Nada (que tanto o incomodavam) tinha a todo momento algo a dizer acerca de ventos e redemoinhos.
O Milton, outro filho das Gerais, cantou algo sobre o vento: as vozes dele. Canção, que aliás, já está postada no rádio deste Blog.
Quanto ao Manoel de Barros, não é mineiro mas conhece muito bem essa sensação esquisita de sentir-se aprisionado no interior do país. Sem um mar para se afogar. Sem sequer uma garota de Ipanema para transformar em verso.
Fico com a prosa do Rosa, com a música do Milton e a poesia do Barros. Quanto a voz rouca da moralidade religiosa, quanto a essa, que vá para o inferno, de onde nunca deveria ter saído.
Abraços.
Companheiros citadinos-acinzentados-que-sonham-com-verdes-montanhas-e-mares-azuis,
graça, paz e bem!
Em meio ao cinza do concreto cá estou, no meu mundo paulista. Ainda há um pouco de verde, água e vento por aqui. O verde está no território de uma escola pública que vejo da janela lateral do meu quarto de dormir, a água mineral está circunscrita ao recipiente de plástico na cozinha e o vento... o vento... bem, o vento ainda sopra por onde quer.
Vocês poderiam comigo entoar a canção que diz: "São, São Paulo meu amor...".
Felicidades!!!
"Eu quis uma vez implantar uma costela no vento." Gostei dessa! Por quê? ele queria se envolver, ligar-se ao corpo (natureza) do vento.(rs)
Acabo de resolver o problema. Desculpe mas era o meu Firefox em um tema meia boca. Por favor apague tudo isso.
Postar um comentário