Esboçou o primeiro golpe com a enxada e ao olhar sádico da memória deteve-se; a terra fofa manteve-se intocável.
Armando um olhar resoluto e erguendo a face, num orgulho pateticamente teatral, partiu com a enxada no ombro. A terra sob seus pés – aquela terra outrora úmida – abria-se agora em asquerosas sendas, como a boca desesperada do cão sedento.
Sentia ódio. A memória sempre vencia, sempre lhe cravava uma espada no peito, sempre afogava seus olhos em estúpidas lágrimas. Ao ser parido, chorou, e certamente foi um choro provocado pela memória, que lhe contava com detalhes sádicos as histórias mais agradáveis do ventre materno.
Não choraria mais. Colocaria no peito uma armadura e a espada da memória nunca mais penetraria ali.
Não choraria mais. E chorou.
Chorou e aquelas míseras gotas alimentaram a sede da terra. A terra úmida que novamente o convidava a enraizar sonhos e pessoas.
Esboçou o golpe com a enxada e a memória novamente sussurrou, lembrando-o do desenraizar – o doloroso e inevitável desenraizar.
* * * *
Armando um olhar resoluto e erguendo a face, num orgulho pateticamente teatral, partiu com a enxada no ombro. A terra sob seus pés – aquela terra outrora úmida – abria-se agora em asquerosas sendas, como a boca desesperada do cão sedento.
Sentia ódio. A memória sempre vencia, sempre lhe cravava uma espada no peito, sempre afogava seus olhos em estúpidas lágrimas. Ao ser parido, chorou, e certamente foi um choro provocado pela memória, que lhe contava com detalhes sádicos as histórias mais agradáveis do ventre materno.
Não choraria mais. Colocaria no peito uma armadura e a espada da memória nunca mais penetraria ali.
Não choraria mais. E chorou.
Chorou e aquelas míseras gotas alimentaram a sede da terra. A terra úmida que novamente o convidava a enraizar sonhos e pessoas.
Esboçou o golpe com a enxada e a memória novamente sussurrou, lembrando-o do desenraizar – o doloroso e inevitável desenraizar.
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4 comentários:
Eu lia com um fundo musical na memória, uma música do Oswaldo Montenegro:
"Olha como folha e pensa como raiz"
......
Talvez, Alisson, eu nunca consiga desenraizar algo da minha memória.
Talvez, o Marquês de Sades baile eternamente ao lado dela.
Mas, hoje, eu não chorei. Nem estupidamente, nem para matar a sede.
......
B-joletas, querido.
Tenha um final de semana bem bom!
Estimado amigo,
Interessante... Postei agora algo sobre a Terra como planeta, não como superfície sólida onde pisamos. Mas, sinceramente, não sei diferenciar um do outro. É justamente no nosso planeta que enraizamos nossos sonhos, memórias, pessoas, et cetera, enfim, tudo aquilo que nos marca como filhos deste chão. Como castigamos nossa mãe! Nossas relações são das piores com aquela para a qual mandamos os nossos mortos. Afinal, do pó viemos, para o pó voltaremos. Todavia, castigamos porque somos castigados. Isso não é desculpa, porque os seres humanos somos sádicos por natureza. A gente estava doida mesmo por comer daquele fruto lá no Éden. Bendita seja Eva que teve coragem de nos fazer conhecer o bem e o mal, isto é, conhecer a nós mesmos. Vou parando por aqui.
Um bom fim de semana!
Apesar de necessário,o desenraizar das coisas que plantamos durante a trajetória,traz sofrimento,pois apesar da memória penetrar com sua espada em nosso peito o tempo todo, abrir mão disso, é tentar arrancar parte do que somos. São nos erros que aprendemos, são nas fraquezas, que somos fortes!
bjs
Amigos,
Obrigado pelos comentários. A indisposição somada ao tempo escasso impede-me de comentá-los, mas não de agradecê-los.
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