A esfera é um corpo sólido incorrigivelmente uniforme e enfastiadamente simétrico: todos os pontos da sua superfície são eqüidistantes do centro e não resta em tamanha harmonia e completude a mínima tolerância com a imaginação dos seus observadores.
Jorge Luís Borges nos recorda que Platão deu forma esférica ao mundo e julgava que o movimento dos corpos celestes era espontâneo e voluntário. O renascentista Giordano Bruno considerava os planetas “grandes animais tranqüilos, de sangue quente e hábitos regulares, dotados de razão”. A lição do teólogo Orígenes era de que “os bem-aventurados ressuscitariam em forma de esferas e entrariam rolando na eternidade”: estou absolutamente convencido de que não há no sinistro Apocalipse de João imagem tão inventiva!!
Tais animais esféricos da zoologia fantástica infestam inúmeros dramalhões da televisão e do cinema – e não raro da literatura. São aquelas personagens que de tão impecavelmente boas (e imperturbáveis na sua bondade) soam patéticas vestidas com nariz e bigode humano, com tudo, de resto, humano - se ao menos fossem Centauros ou roliças esferas rolando para a eternidade...
Os mesmos dramalhões apresentam também o diametralmente oposto: o vilão por excelência, o sujeito inteiramente quadrado e perverso, aquele que precisa ser derrotado – morto, internado no hospício ou coisa que o valha – para que o dramalhão chegue ao seu último e previsível capítulo.
Sabemos que não há lugar para esferas ou quadrados, tampouco para capítulos previsíveis (nem haverá no próximo ano!!) neste palco onde transitam seres de útero e razão. Somos, todos nós, qualquer coisa sinuosa entre a esfera e o quadrado.
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5 comentários:
Sem dúvida, e berando mais o quadrado que o esférico. Apesar que se seria uma boa entrar no novo ano rolando. Pelo menos, seria melhor do que entrar enrolando. Hummm! Foi mal. :D Abração para você, também e feliz ano novo.
Um cilindro, que tal!?
Belo texto! Sou por natureza quadrado, mas a graça (favor divino imerecido) me faz redondo, quando quiser e do jeito que quiser. Ser quadrado é um problema meu. Ser redondo é um problema dos céus.
Eu pensei no Homem Vitruviano, de Da Vinci.
Eu não estou entre a esfera e o quadrado.
Eu não sou o triângulo.
B-joletas
Boa sugestão, Anderson, um cilindro. Embora a Tamara esteja certa ao dizer que não é um triângulo. Talvez sejamos alguma coisa inominada entre a esfera e o quadrado.
Tamara: o Homem Vitruviano! Você tem razão. Vou ilustrar o post com o dito cujo. Obrigado! Ahh, e vê se não some!
Beijos.
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