sábado, outubro 27, 2007

Olhar materno

No olhar de Deus não cabe um feixe sequer de repreensão. Compassivo, ri de nossas reincidentes quedas: ri como quem diz, levante-se filho, ouse continuar pedalando, ouse continuar caindo. Caia uma e outra vez, e faça de cada queda uma ascensão, de cada queda um motivo para beber da motivação indestrutível e inesgotável que trago em minhas pupilas.

Não há ali, nas pupilas divinas, um raio sequer de cobrança. O Eterno insiste em gravar em suas retinas os melhores momentos de nossa tortuosa biografia, de nossos quase imperceptíveis progressos, embora tenha apagado de antemão todos nossos tropeços, todas nossas eventuais e inevitáveis involuções.

Também chora, os olhos do Divino. Chora lágrimas amargas ao divisar o trabalho diabólico que insistimos em tecer com nossas mãos trêmulas e angustiadas: o medo, a culpa, estas infaustas algemas que forjamos para nós mesmos.

Injetadas de amor estão as veias infinitas do olhar divino: o amor que nesta madrugada vazia me atingiu novamente, quando eu mais uma vez apalpava atormentado minha labiríntica condição.

* * * *

5 comentários:

Felipe Fanuel disse...

Materno, Eterno, Divino são eufemismos. Deus é Abba! É Mãe! É Pai! Novos eufemismos...

Alysson Amorim disse...

Tens razão, meu caro. Tens razão. Tudo não passa de eufemismos. Mas que seríamos de nós sem eles, os eufemismos?

Tamara Queiroz disse...

Matriarcal, sensorial e desrepressor.

Ótimo!

will jesse dias disse...

Otimo. A unica diferenca e q a crianca na bicicleta nao se joga ao chao...

Janete Cardoso disse...

"Nem eu te condeno, vá e não peques mais".
Jesus não negou o erro da pecadora, nem o ignorou, mas a absolveu e a livrou da tirania da culpa.
beijos