sábado, setembro 08, 2007

Tragédia em Ponte Nova

Cansei de dizer que a imprensa é seletiva. O fato é notório e não merece considerações mais detalhadas. Hoje a crise no setor aéreo divide com o julgamento dos mensaleiros o topo do pódio. Amanhã os atores mudam, conquanto a regra permaneça a mesma: excesso de informação e escassez na profundidade.

No interior de Minas Gerais 25 presos morrem queimados. Levando em conta a dimensão da tragédia, não seria injusto apontar que a mídia se valeu de notas de rodapé para informá-la. Tamanha indiferença atinge até o pessoal do Observatório da Imprensa, conhecidos por criticar sempre exemplarmente a atuação dos meios de comunicação. Fiquei impressionado ao constatar que o fato foi ignorado inclusive por veículos de comunicação alternativos, geralmente atentos na defesa dos direitos humanos (ex. Agência Carta Maior). Fazendo meu mea-culpa, o silêncio também reinou na blogosfera.

A crise do sistema penitenciário é global. Lembrando Foucault, a prisão nasceu fracassada, embora, sob outra perspectiva, seja uma das invenções mais engenhosas e bem sucedidas da história humana, particularmente da história do capitalismo.

Na periferia do mundo a situação é ainda mais delicada. Em recente pesquisa acadêmica constatei que mais de 80% dos condenados pela 1º Vara Criminal da Comarca de Belo Horizonte, no exercício de 2005, cometeram delitos contra o patrimônio. Embora pobre em sua abrangência, a pesquisa constatou um fato alarmante: a desigualdade social, sobretudo nos grandes centros urbanos, é um motor que põe em funcionamento o inchaço das penitenciárias, armadas para proteger a propriedade privada de seus potenciais algozes.

A crise do sistema penitenciário, enquanto não diz respeito aos perfumados moradores do asfalto, definitivamente não importa. Preso portando celular é um problema a ser resolvido. Quanto a preso queimado, não dizem assim tão confessadamente, mas a indiferença tem lá suas cordas vocais: preso queimado é solução. Aqueles tecidos carbonizados não servem nem mesmo a pirotecnia da imprensa ou ao oportunismo político, posto que não açodam assim tão facilmente a solidariedade das massas.

Em homenagem as vítimas da tragédia de Ponte Nova.

* * * *

10 comentários:

O Tempo Passa disse...

Grande texto.
Mea culpa também. Não dei a mínima atenção à tragédia.
Sou solidário, ok?
Um abraço

Anônimo disse...

Sim, muito bom. Pior é que Jesus foi explícito sobre a necessidade de olharmos pelos que estivessem em prisão e Ele estava falando desse pessoal, sim.

Maya Felix disse...

Alysson, concordo com muito do que você diz, sim. A cadeia não é feita para reeducar, para ressocializar, para transformar vidas. Nem nós, cristãos, somos formados para ir lá. Nem lá, nem aos hospitais, nem aos leprosários, onde Che Guevara foi. Nem aos prostíbulos, nem às favelas. Nem aos lixões, onde gente cata comida podre e outras coisas, pra não morrer. Nós somos educados, como cristãos, a pensar muito sobre o que é Deus e agir pouco em obediência ao que Ele observa nos profetas, nos evangelhos, nas cartas, nos salmos, em todo canto. Fazemos nossos blogs e lhes dedicamos um tempo monstruoso; nos deleitamos em nossa capacidade intelectual; adoramos polemizar sobre a Bíblia e sobre quem tem razão, se foi melhor o Frei Joaquim ou o Frei Serapião. E os desgraçados, os sacaneados, os roubados, pilhados, violentados são apenas um aspecto de nossa bela retórica.

Anderson Moraes disse...

E a crise aeronáutica recebe toda a atenção... Quem será que matou mais e dura há mais tempo? A crise aeronáutica ou a penitenciária?

Dos dois lados do Equador disse...

Alysson,
Nisso há também a seletividade de que esta tragédia não aconteceu em Bangu I ou em qualquer outra cadeia de São Paulo. Se assim fosse até o Lula viria à TV.

De resto e de fato a Maya disse tudo.

Bjão,

MamaNunes disse...

A gente não se dá conta do tamanho do descaso, do desrespeito à vida.
A Maya disse tudo.
Tive um tio no Carandiru por 8 anos, ví o inferno de perto,
o absurdo!
Mais tarde, desenvolvi em Alocólicos Anonimos um programa de visitas semanais às presidiárias adictas. A "doença" nos irmanava.
Entre evangélicos, fui estimulada a orar e orar e orar....
Sim, tudo bem orar, mas a fé sem obras...
Mea culpa idem.
Um abração!
:o)

Felipe Fanuel disse...

Mesmo lendo jornal todo dia, há muito tempo não sigo o roteiro da imprensa no blog. Sinceramente não vale a pena.

Excelente lembrança trazer à memória o corpo e o sangue de Jesus queimados lá nas celas da injustiça. "Estive preso e não me visitastes", palavras dele próprio!

Meu forte abraço.

Felipe Fanuel disse...

Vou ao Maracanã hoje. Se o Cruzeiro ganhar do Flamengo, ficamos a 6 pontos do Todo-Poderoso São Paulo. Entre Paulo e Jesus, fico com Jesus. Que ele abençoe o nosso time azul, da cor do céu!

Vando Barboza disse...

kkk
felipe fanuel,
ri bastante com seu coment...
acontece q o flamengo, anda precisando mesmo é de uma ajudinha do "santo das causas impossíveis", o tal do São Judas Tadeu, padroeiro do time das massas. e parece que, ontem, o fRamengo foi ouvido.
Uma pena, mas é assim q foi.
No fim, ainda há esperança da segundona.
Abçs,

Felipe Fanuel disse...

Jesus é cruzeirense, mas o capeta é flamenguista. Disso não tenho dúvida. Tinha alguma urucubaca (sic) atrás do gol deles!