É inquestionável nossa vocação teatral. Vejamos a peça da Independência. Uma peça em um único e magistral ato. D. Pedro I, a espada erguida, a fala imortalizada: "independência ou morte!". Do lado oposto (que genialidade da equipe de montagem!) a única espada erguida era a dele mesmo, nosso libertador, refletida no espelho do Ipiranga.
Sem uma gota sequer de sangue e os grilhões estavam definitivamente quebrados. As senzalas abertas, os pactos coloniais rompidos. Um ode à liberdade, senhores, um ode à liberdade.
Os ventos da liberdade escreveram a Constituição imperial, dois anos depois. Liberté, Igualité, Fraternité! Os melhores teatrólogos eram os formados pelo teatro do Legislativo.
Os adereços negros foram avisados. Aguardem, é preciso aguardar. Logo implodiremos as senzalas, logo as normas constitucionais terão eficácia plena. É preciso aguardar: a economia entrará nos eixos e então as alforrias serão distribuídas em praça pública. Os adereços teatrais, enfim, virarão atores. É preciso aguardar o ato final.
Nos palcos oceânicos os navios ingleses fechavam o cerco contra o (agora) tráfico de escravos. Quando se viam cercados pelos ingleses, os traficantes descarregavam o produto do delito em alto mar (1). O script da abolição do tráfico, datado de 1831, não passava de mais uma peça não montada, para inglês ver.
Em 1888, enfim, as alforrias foram distribuídas pela benevolente princesa Isabel (que cena comovente! a princesa libertando os negros). As senzalas esvaziadas e seus ocupantes lançados nas esquinas e nos morros, onde ainda permanecem. Atores, enfim.
Atores de uma tragédia grega. O papel do destino fica por conta da economia. Quanto ao ato final, já estamos nele. É o fim da história, meus caros. O fim da peça. Podem aplaudir.
(1) Caio Pradro Júnior, em História Econômica do Brasil, narra este triste epidódio histórico: "Quem se incumbirá de executar a lei brasileira será mais uma vez a Inglaterra, cujos cruzeiros, livres agora de qualquer restrição, redobram de atividade. Mas a repressão, apesar do direito de visita em alto mar, lutava com uma grande dificuldade: é que os navios negreiros, quando se viam acossados pelo inimigo e não lhes podia escapar, lançavam ao mar sua carga humana, destruindo assim o corpo do delito comprometedor, e inocentando-se com isso perante os Tribunais internacionais que os deviam julgar (...) Os escravos atirados ao mar iam com pesadas pedras atadas ao pescoço, a fim de submergirem logo e não serem avistados.
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Sem uma gota sequer de sangue e os grilhões estavam definitivamente quebrados. As senzalas abertas, os pactos coloniais rompidos. Um ode à liberdade, senhores, um ode à liberdade.
Os ventos da liberdade escreveram a Constituição imperial, dois anos depois. Liberté, Igualité, Fraternité! Os melhores teatrólogos eram os formados pelo teatro do Legislativo.
Os adereços negros foram avisados. Aguardem, é preciso aguardar. Logo implodiremos as senzalas, logo as normas constitucionais terão eficácia plena. É preciso aguardar: a economia entrará nos eixos e então as alforrias serão distribuídas em praça pública. Os adereços teatrais, enfim, virarão atores. É preciso aguardar o ato final.
Nos palcos oceânicos os navios ingleses fechavam o cerco contra o (agora) tráfico de escravos. Quando se viam cercados pelos ingleses, os traficantes descarregavam o produto do delito em alto mar (1). O script da abolição do tráfico, datado de 1831, não passava de mais uma peça não montada, para inglês ver.
Em 1888, enfim, as alforrias foram distribuídas pela benevolente princesa Isabel (que cena comovente! a princesa libertando os negros). As senzalas esvaziadas e seus ocupantes lançados nas esquinas e nos morros, onde ainda permanecem. Atores, enfim.
Atores de uma tragédia grega. O papel do destino fica por conta da economia. Quanto ao ato final, já estamos nele. É o fim da história, meus caros. O fim da peça. Podem aplaudir.
(1) Caio Pradro Júnior, em História Econômica do Brasil, narra este triste epidódio histórico: "Quem se incumbirá de executar a lei brasileira será mais uma vez a Inglaterra, cujos cruzeiros, livres agora de qualquer restrição, redobram de atividade. Mas a repressão, apesar do direito de visita em alto mar, lutava com uma grande dificuldade: é que os navios negreiros, quando se viam acossados pelo inimigo e não lhes podia escapar, lançavam ao mar sua carga humana, destruindo assim o corpo do delito comprometedor, e inocentando-se com isso perante os Tribunais internacionais que os deviam julgar (...) Os escravos atirados ao mar iam com pesadas pedras atadas ao pescoço, a fim de submergirem logo e não serem avistados.
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